Foto: Renata Madureira |
Entrevista concedida via e-mail para estudantes de Letras- Portugal:
L- Você já escreveu oito
livros, mas é pouco conhecido no Brasil, a que se deve essa sua ausência do
grande público?
E- Eu vivo e escrevo no
interior do nordeste brasileiro, longe dos grandes centros, não tenho redes de contatos,
redes de contatos com jornalistas e pessoas da mídia, ao menos aqui isso é
muito importante e pode decidir o futuro de alguém, seja nas artes ou até na
política, por outro lado escrevo em contradição com que se faz hoje no país, há
uma busca, na literatura contemporânea, em desvendar os “mistérios” das coisas,
minha literatura é mais áspera e objetiva, ainda há o fator político, minha
ruptura com o partido comunista e posição de crítica ao governo certamente
dificulta a divulgação da minha literatura.
L- Ao falar da sua ruptura com
o partido comunista e que isso pode impedir a divulgação da sua literatura, você
acha que há censura no Brasil?
E- Oficialmente não, mas há a
censura ideológica e do medo, você posta algo na internet as pessoas olham, mas
não compartilham, não comentam, poucas pessoas no Brasil tem independência
intelectual, o governo e sua militância não aceitam críticas, sem falar na cooptação
de artistas, o governo é um grande produtor artístico.
L- Em seu ultimo livro e
primeiro romance você cria uma negativa sociedade, podemos dizer que é uma
visão pessimista das relações humanas e política? Você acredita que perdemos a
capacidade realizarmos coisas boas através da política?
E- Urbem Angeli é um romance
seco, é como sinto essa atual sociedade, promíscua e permissiva com os crimes
políticos, o Brasil não vive um bom momento, estamos sitiados em guetos, ora
religiosos, ora de “gêneros” e até étnicos que fingidamente dizem lutar por
direitos civis, mas por trás de cada suposta boa intenção salvadora há a velha
busca pelo poder político e pela afirmação desse poder, enquanto no dia dia o
povo vive em completo abandono, não nego que há pessoas sinceras e que desejam
um país melhor, mas esses são a minoria, ilhadas também em seus guetos de
impotência, o Brasil de hoje é egoísta e hipócrita, direita e esquerda se
confundem no mar de lama que inventaram para eles mesmos. Perder a fé, mesmo
assim, completamente na política seria o pior dos caminhos, ainda tenho algo de
crenças, é preciso mantenho a esperança, como aquela que em Urbem Angeli posou
em Joana.
L- Você é autor de livros de
poemas, o que a poesia tem a nos dizer nos dias de hoje?
E- Há uma questão que sempre
digo: os cursos de letras e escolas fizeram um desserviço à poesia, muita gente
acredita que poesia é para cantar o “belo” e tão somente esse “belo”,
eternizaram a ideia do poeta mártir e o pior, que “poeta bom e poeta morto”, necrofagia literária.
A poesia é a arte por
excelência de todas as contradições da vida, há poesia no que julgamos bonito
tanto quando no que dissemos ser feio, a poesia tem a nos dizer que estamos
sentados sobre o lixo do mundo, mas que sobre nossas cabeças o céu continua
azul, há caminhos entre palavras e sentimentos.
Editoras grandes e com poder
de divulgação não editam poetas contemporâneos, por isso penso que o governo
deveria colocar no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) autores não só poetas, no programa de provas, isso em
pouco tempo renovaria a literatura nacional e daria animo para os autores
publicarem seus livros e editoras editaram também esses novos autores.
L- O Brasil tem fama de país
que se lê pouco, é verdade?
E- Em algum lugar no passado
isso era verdade, mas agora isso perde força, claro, ainda não estamos em
um bom nível de leitura, mas estamos avançando, já somos um dos países no mundo
que mais edita livros, se editamos lemos também. Grandes editoras
multinacionais estão aqui, editoras como o Clube de Autores, que edito meus
livros, tem um número enorme de autores, logo logo seremos um dos países que
mais se ler no mundo.
L- Otimista (risos)
E- Não se esqueça, este é um
país de contradições gigantescas, continentais, você pode mudar de lado em uma
rua e sair do terceiro mundo para o primeiro, ir da Urbem Angeli a Paulo
Coelho, nossa essência não é a linha reta, como escreveu Fernando Pessoa, nós
andamos sempre na linha torta, Deus aqui mais que em qualquer outro lugar
escreve certo por linhas tortas.
L- Você também escreveu
canções, teve bandas, como foi isso?
E- Eu nunca fui músico ou
cantor, no começo dos anos de 1990 tinha vontade de dizer coisas, mas nem
sonhava em lançar um livro, era algo distante, então meu pai me deu um violão (tenho
até hoje) e comecei a fazer umas músicas, mas tudo em função da palavra e não
da música em si, um dia juntamente com Preto Paulo (Marcos Paulo) criamos a Som
Marginal, depois Flor Marginal, ao encontrar o Marquinhos, tudo se encaminhou,
ele tinha a voz o talento para música e eu para escrever, encontrei outros
parceiros, outras pessoas que cantaram minhas músicas, mas tudo que fiz foi por
conta da literatura.
L- Como você sente as relações
humanas? E como esse sentir reflete na sua literatura?
E- Já fui muito aberto, creio
que mais simpático em relação a outras pessoas, mas tenho (infelizmente) me
fechado, tenho sentido tanta falta de ternura e gentileza, o diálogo perdendo
para o grito, relações que nascem e morrem sem ter nada de bom para ser
lembrado, pessoas que julgam as outras tão somente porque elas são do nordeste
ou do sul, por uma foto. Tudo isso tem me retraído, pouco a pouco fui perdendo
alegria da convivência, gente me faz sentir medo, medo me machucarem, de perder
a fé na beleza que é conviver em grupo, às vezes penso que o elevador de
serviços é o melhor lugar do mundo, não se corre riscos.
A banalidade como a vida é
tratada é muito assustador, mas com o tempo se aprende a gostar do gênero humano
mais de que de pessoas, selecionar melhor quem desejamos perto do nosso
coração, amar e perdoar, porque sentir tudo isso não nos transforma em santos,
somos todos pecadores e bem pecadores, talvez e certamente alguém me olhe e
sinta tudo isso que acabei de dizer em relação também a mim.
Minha literatura não é autobiográfica,
no entanto a maneira que vejo o mundo também se reflete nela, às vezes quando
escrevo poemas suaves e esperançosos sou eu dizendo para mim mesmo que devo
seguir em frente, ter esperança em mim mesmo, olhar a vida e sorrir para o
melhor que sou e tentar nunca machucar pessoa alguma, sou a minha parte, meu
sereno e alegria.
L- Agradecemos por sua
gentileza em nos atender, foi bastante proveitoso para nosso trabalho sobre
literatura brasileira, muito obrigado mesmo!!!
E- Eu que agradeço, muito
obrigado pela leitura dos meus livros, bom saber que tão longe sou lindo, paz e
alegria sincera sempre!
Ediney Santana escreve
regularmente nos seguintes blogs:
Seus livros podem ser
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